Assédio sexual: volta ao trabalho presencial expõe mulheres a antigos riscos

Empresas podem ser responsabilizadas em processos trabalhistas em caso de agressões dentro do ambiente corporativo.

Em 2020, por conta da Covid-19, as portas se fecharam e o trabalho passou – quando possível – a ser dentro de casa. Com isso, muitas mudanças na rotina aconteceram. Uma delas foi não precisar mais se deslocar para ir ao trabalho, diminuindo, para muitas mulheres, os riscos de se expor às ruas, onde poderiam ser vítimas de algum tipo de violência, como importunação sexual.

Na retomada aos poucos da “normalidade”, no formato de trabalho presencial ou híbrido, a atenção se redobra para os trajetos e também para as relações profissionais dentro e fora dos locais de trabalho, com foco no combate ao assédio sexual, que, por definição, envolve uma relação hierárquica profissional entre o agressor e a vítima. No ambiente corporativo, pressupõe-se, tanto no assédio moral quanto no sexual, a exposição da vítima a situações constrangedoras, repetidas e prolongadas em sua jornada de trabalho. E com o adicional, muitas vezes, da pressão imposta pelo fato do agressor poder, de alguma forma, chantagear e prejudicar a situação profissional da vítima, por retaliação. Casos de assédio podem ser condutas como tentativas de beijos, mensagens conotação sexual, convites insistentes para carona ou para saírem juntos. Neste sentido, departamentos de compliance e Recursos Humanos devem estar atentos a políticas de combate ao assédio dentro das empresas.

– Se a empresa não se atenta aos agressores, é ela que será responsável, inicialmente, num processo trabalhista. É preciso que haja um trabalho de consultoria, preventivo, para orientar os superiores hierárquicos a respeito do assédio sexual. É com orientação que conseguimos dar o melhor caminho aos funcionários – destaca a professora de Direito do Trabalho da Universidade Metodista de São Paulo (UMESP) Elaine Cristina Saraiva.

Em pesquisa sobre o assédio sexual no ambiente de trabalho – on ou offline – feita no início de 2020 pela Think Eva, em parceria com o Linkedin, com mulheres em todo o Brasil, as ações mais citadas foram de solicitação de favores sexuais (92%), contato físico não solicitado (91%) e abuso sexual (60%).

Para Saraiva, as empresas devem estar sempre atentas ao tema assédio, independentemente da volta ao trabalho presencial. Uma situação pode ser configurada como assédio tanto no trabalho presencial quanto no remoto, em casa, desde que o superior hierárquico ameace o seu subordinado para tirar alguma vantagem, como falar que se a pessoa sair com ele, ganhará um aumento ou promoção.

Aumento das denúncias

Para se ter uma ideia do problema a ser enfrentado, apenas nos primeiros seis meses de 2021, foram registradas 31 mil denúncias de assédio moral e sexual nas empresas cujos canais de queixas são administrados pela consultoria ICTS Protiviti. Em comparação aos anos anteriores, o número é três vezes maior que os registrados em 2019 e 2020 inteiros, quando foram comunicados 12.349 e 12.529 casos, respectivamente.

Sobre casos de importunação sexual no caminho ao trabalho, Saraiva diz que não é exatamente uma questão de as mulheres se protegerem, já que elas não são as culpadas pelos crimes. A professora também explica que as empresas não têm responsabilidade sobre episódios ocorridos nos trajetos até o trabalho.

– Se pensarmos em transportes de um modo geral, transportes públicos, a empresa não é responsabilizada – afirma. 

Saraiva destaca que com relação aos crimes de importunação sexual, assim como nos de assédio, o importante é sempre denunciar. Em ambas as situações, especialistas indicam que o ideal é procurar uma delegacia e fazer um registro de ocorrência. Com relação ao assédio, por exemplo, o Ministério Público do Trabalho (MPT) tem um canal direto de denúncias pelos quais a vítima pode, inclusive, pedir sigilo e a empresa não saberá a autoria da queixa.

Fonte: O Globo